Em março deste ano, o Brasil recebeu a notícia de que a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) retiraria o certificado de país livre do vírus do sarampo, após surtos da doença serem registrados por mais de 12 meses. Tudo começou em fevereiro de 2018, quando venezuelanos atravessaram a fronteira por Amazonas e Roraima. Os dois estados sofreram com surtos.
Naquele ano, mais de 10 mil pessoas foram afetadas com a doença, em todo o país. Neste ano, de acordo com boletim epidemiológico disponibilizado pelo Ministério da Saúde, já foram confirmados 2.331 casos da doença em 13 estados da federação, em um período de 12 semanas analisadas.
O Brasil havia obtido o certificado de país livre do sarampo em 2016. Mas há muitos anos não se ouvia mais falar dessa doença infecciosa considerada grave, causada por vírus, que é transmitida pelo ar, através da tosse, da fala, do espirro, da respiração e que somente se previne pela vacina. Por ser altamente transmissível, é preciso que ao menos 95% da população esteja vacinada para evitar epidemia.
No entanto, as pessoas têm procurado cada vez menos se prevenir. Um dos motivos para isso pode-se dizer que seja a falta de informação. Mas, pior do que isso, também podemos atribuir este mal que assola a população à desinformação, a pessoas que se dão ao trabalho de elaborar conteúdos falsos e divulgar na internet, principalmente em grupos de WhatsApp. São pessoas desonestas, que se aproveitam da ignorância dos outros, que já saem replicando o material sem desconfiar, sem procurar saber se é verdade.
O resultado disso está aí: surtos em três estados, principalmente em São Paulo. As mais afetadas são as crianças de até 1 ano de idade, justamente porque não completaram o calendário de vacinação e também porque, naturalmente, ainda não estão com o sistema imunológico bem desenvolvido. Enquanto nos adultos a consequência mais grave do sarampo é a pneumonia, nas crianças, além desta, ainda há risco de otite que pode desencadear uma surdez permanente, encefalite aguda e morte.

Dose Zero
Para combater esse perigo, o Ministério da Saúde liberou para os bebês de 6 a 11 meses, uma dose extra da vacina tríplice viral (que além do sarampo, também previne a caxumba e a rubéola), a chamada “dose zero”, uma vez que antecede as duas doses habituais, aplicadas aos 12 e aos 15 meses de idade. A vacina é disponibilizada em todos os postos de saúde do Brasil, gratuitamente.
Eu levei a Laura para tomar a vacina no último dia 29, no postinho do bairro Bela Vista, em Cuiabá. Outras mamães que conheço já vacinaram seus bebês em postos de saúde de outros bairros. Assim como ocorreu aqui em casa, essas mamães relataram que seus filhos não tiveram nenhuma “reação” à vacina.
E mesmo que houvesse reação, vamos combinar que é melhor sofrer uma reação em decorrência da criação de anticorpos do que sofrer com o efeito do vírus vivasso da silva atacando o organismo do seu bebê, não é mesmo minha gente?! Bom, pelo menos eu prefiro a primeira opção.
Vacinas: um tema a ser debatido sempre
Em julho, eu publiquei aqui uma matéria sobre a vacinação nas gestantes e comecei esse debate sobre a importância desse tema. Naquela época, Laura e eu participamos de uma roda de conversa sobre vacinação nos bebês, onde as enfermeiras Izadora Barros, da Materna Care, e Raiany Ignatz, da clínica de vacinação Saúde Livre Cuiabá, tiraram dúvidas das mamães presentes e explicaram questões técnicas que, vez ou outra, geram confusão entre os leigos.

Um dos temas foi a interferência das “fake news” na decisão das pessoas de se vacinarem e vacinarem seus filhos ou não. De acordo com Raiany, que trabalha diretamente com a aplicação da vacina, ou seja, tem contato direto com o público, tem sido comum a desconfiança das pessoas em relação às vacinas, como, por exemplo, a da gripe. São pessoas que acreditam em “teorias da conspiração” e alegam que conhecem pessoas que já tomaram a vacina e, logo em seguida, ficaram gripadas.
“A gente senta com a pessoa, ouve o que ela tem a nos dizer e a orienta no formato que está na bula e no formato que a Sociedade Brasileira de Imunização diz, que a vacina da gripe, por exemplo, é uma vacina de vírus inativado, então, ela não tem como causar a doença. E ela protege também contra 4 sorotipos da gripe que são mais letais, mais perigosos, como H1N1, H3N2 e os dois sorotipos B. Além disso, os vírus da gripe são inúmeros, são incontáveis, são mais de 300 tipos de vírus da gripe e a nossa vacina tem apenas 4. Então, ela não vai proteger contra aquele resfriado, aqueles outros sorotipos da gripe, que não são tão letais. Então, acontece muito isso e também acontece muito da pessoa estar com o vírus incubado, estar com início dessa gripe, ela toma a vacina e veio o sintomas e ela acha que é a vacina”, relata a enfermeira.
A profissional explica ainda que o efeito protetivo da vacina não é imediato, chegando a levar entre 7 a 14 dias para fazer efeito. “Então, se você tomou a vacina hoje, daqui a 10 dias que você vai estar protegido contra aquela doença. Não é assim: tomou a vacina agora e já vai estar protegido agora”, avisa.
“Saúde Sem Fake News”
Em relação às fake news sobre vacinas e diversos outros assuntos ligados à saúde, o Ministério da Saúde disponibiliza à população o serviço “Saúde Sem Fake News”, que consiste em um contato de WhatsApp específico para esclarecer informações virais que as pessoas recebem. Os conteúdos são apurados pela equipe técnica e respondidos se são verdadeiros ou falsos. Qualquer cidadão pode enviar gratuitamente mensagens com imagens, vídeos ou textos que tenha recebido nas redes sociais para confirmar se a informação procede, antes de continuar compartilhando. O número é (61)99289-4640.
Algumas dessas “correntes” já tiveram suas explicações dadas pelo governo. Vou elencar aqui em baixo alguns links:
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10 razões pelas quais não deveria vacinas seu filho. É fake news!
Vacinas causam autismo. É fake news!
Reações das vacinas
Voltando às queixas que as profissionais da saúde mais escutam das pessoas em relação à vacina, a questão da “reação” é uma delas. Muitas pessoas comentam que determinada enfermeira “com a mão pesada” foi culpada por algum inchaço na região vacinada. “Cada organismo responde de uma forma em relação à vacina. Então, às vezes, uma pessoa, criança ou adulto, pode ter uma reação exacerbada e outra não. Isso varia de organismo para organismo”, afirma Raiany Ignatz.

Ao Minha Filha, Minha Mãe, a enfermeira obstetra Izadora Barros explica que a reação tem a ver com a composição da vacina. Existem vacinas que são acelulares, ou seja, feitas com a proteína da bactéria, gerando reações mais leves ou mesmo não gerando reações no paciente. Já as vacinas celulares são feitas com as bactérias inteiras e, por isso, a reação é mais intensa. A enfermeira complementa que esta é uma diferença entre as vacinas da rede particular e do Sistema Único de Saúde (SUS): enquanto a primeira utiliza vacinas acelulares, que causam menos reação, o serviço público fornece algumas vacinas feitas de bactérias inteiras, que têm maior chance de causar reações mais desconfortáveis. “Mas vai do organismo de cada um”, lembra Izadora.
Pacientes alérgicos
A relação entre a composição das vacinas e suas reações pode ser mais perceptível por pessoas alérgicas a alguns componentes, como ovo de galinha, por exemplo. Algumas vacinas são feitas com gema de ovo e podem causar reações mais fortes em algumas crianças alérgicas. No posto de saúde, a enfermeira que aplicou a vacina na Laura (que não é alérgica) explicou que, nesse caso, a mãe deve combinar com a unidade de saúde para que a aplicação ocorra num ambiente hospitalar, geralmente uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), para que, caso haja reação adversa, o paciente seja atendido na hora.
Leia também – Por que é importante se vacinar durante a gravidez?
Tenha calma quando o bebê reagir à vacina
Conforme Izadora Barros, que trabalha no Hospital Santa Rosa, hoje em dia, é comum as mães se desesperarem e correrem para o pronto atendimento com o bebê, muitas vezes sem necessidade e expondo a criança a diversos vírus e bactérias que circulam nesses locais, por conta das reações adversas da vacinação. Segundo a enfermeira, as mães precisam entender que “a vacina em si não é inimiga da mãe” e, portanto, não precisam ter medo de lidar com tal situação.
“A mãe tem que ser orientada no seguinte: eu fiz vacina no meu filho, eu tenho que ver a temperatura de 4 em 4 horas. Porque uma reação de febre não é do dia para a noite. Ela é rápida, mas tem que ser acompanhada. Então, vamos supor: se uma criança está com 37,8 eu não vou para o hospital, eu vou dar o remédio conforme a orientação do pediatra, vou dar o banho no bebê. Se a febre não baixou, está em 38, eu vou dar o banho novamente e vou dar o remédio. Se daqui a 4 horas está em 39, aí eu vou para o hospital. Não ir para o hospital com 37,8 ou com 38. É ir para o hospital com 39 porque já deu o remédio, deu o banho e não resolveu. Então, ela conseguir intervir dentro de casa, tirar a roupinha, deixar esse bebê um pouco sem roupa e fazer compressa na perna, no braço. Só a BCG que não faz nenhum tipo de compressa. Mas a mãe tem que ter um gelinho, compressa quente e compressa fria na perninha”, explica Izadora.
A culpa não é da escolinha
Outro ponto destacado pelas enfermeiras é que é comum entre os pais atribuir à ida dos filhos às creches e escolinhas a causa das doenças, pelo fato de serem locais fechados e com muitas crianças juntas, ou seja, propícios a proliferação de vírus. No entanto, elas lembram que, e muitos casos, o bebê “pega” algum vírus no próprio meio familiar, uma vez que o foco da vacinação está nele, mas não nos demais membros.
“Quando a mamãe está gestante, ela sempre se protege, mas, às vezes, esquece de proteger o papai, esquece de proteger a vovó, a titia. Uma pessoa que é muito importante na vida do bebê e que geralmente acaba sem proteção é a babá. Ás vezes, a pessoa protege todo mundo, mas a babá não toma a vacina. E a babá, ás vezes ela anda de ônibus e, ás vezes, pode estar trazendo. E a babá é a pessoa que mais ajuda a mamãe, que mais está com o bebê e ela também precisa de proteção”, orienta Ignatz.
Intercâmbio na vacinação
Outra dúvida que foi respondida por Izadora e Raiany durante a roda de conversa sobre a vacinação foi se tem problema começar a vacinar a criança no SUS e depois passar para a rede particular ou vice-versa. E a resposta é não. A única diferença é que algumas vacinas aplicadas na rede privada protegem contra um grupo maior de vírus ou bactérias. Por exemplo: enquanto a rotavírus oferecida pelo SUS protege contra um tipo de vírus (monovalente), a da rede privada protege contra cinco tipos (pentavalente). “Não tem problema nenhum dela mudar, mas ela vai sair perdendo se sair da particular pra ir para o SUS porque tem algumas vacinas que são mais benéficas na rede particular”, opina Izadora Barros.
Para saber mais, confira o calendário de vacinação da criança até 10 anos e ao calendário de vacinação do prematuro até 1 ano de idade, conforme a Sociedade Brasileira de Imunizaçõesaa (SBIm).